Ele
tem quarenta e nove anos e uma camiseta com os dizeres “Keith Richards For
President” meio desbotada que insiste em colocar por baixo do paletó. Usa aqueles
óculos escuros que escondem seus olhos perdidos e tristes. Segue escrevendo seus textos loucos e
profeticamente neuróticos sobre “as merdas humanas” e insiste em tocar gaitinha
de boca, mesmo que não tenha nenhuma aptidão para isso. Os vizinhos concordam,
sua garota concorda e talvez até ele mesmo, se pensar um pouco a respeito
concorde, mas simplesmente não pode deixar de tocá-la por algum motivo que desconhece.
Quando toca blues é somente mais um cara triste, ficando azul. Talvez se
aproxime do céu afinal. Tem sempre um hálito de quem enxugou algumas garrafas
de cerveja, mesmo que não tenha bebido absolutamente nada. Está entranhado o
cheiro de álcool pelos seus lábios, encardido na sua boca. Talvez não tenha
paciência para higienização bucal ou anda meio doente. Passa muito tempo com o
seu cão, aquele com nome engraçado, raça exótica e quase sempre é o
suficiente. Não gosta de muitas companhias, não precisa de amigos, mas alguém
sempre está pendurado em suas bolas. Fanzocas idiotas. Sua garota diverte-se,
mas sempre reclama quando tira a sua cueca para fazerem amor e as vê por lá. Ele
precisa dela, somente dela, mas nunca deixa isso claro. Banca sempre o indiferente,
pois tem medo que ela o descubra tão pequeno, frágil, carregado de amor e com
um só golpe o reduza a nada. As mulheres fazem esse tipo de coisa quando tem
esse poder em mãos. Aprendera com a vida muitas coisas, tinha praticamente meio
século, mas somente essa pequena lição levava a sério. Essa e aquela sobre
nunca discutir com garçons. Rói unhas, devora na verdade e lê muito. Mas nada
desse século e prefere assistir uma novela a encarar Shakespeare. A trama é a mesma, mas pelo menos na televisão os diálogos não são tão
rebuscados. Não tem nenhum tipo de apego material, ambição e estagnou numa vida
fascinante aos olhos de muitos, confortável para quem está dentro e absurda
para quem insiste em espiar. Morreu uma vez, mas só de sacanagem. Ele é assim,
um filho da puta sem precedentes. Certa vez num evento beneficente da ONU
chutou o rabo humanitário do Bono Vox cantarolando “Sympathy For The Devil” até
a saída. Às vezes volta a ser criança e em poucos segundos cresce, parte pra
cima e aborrece com um leão velho. Mas assim que dá uns rugidos ao vento volta
a ficar azul. Adora nadar e faz o tipo que dá todo o gás na ida e não guarda
nada de energia para a volta. Morre na praia afogado de amor. Passional do
caralho. Andaria de bicicleta, mas não gosta de pedalar, quer mesmo é poluir o
ar, mas não se esconde e vai de conversível. Respira o mundo cinza, fuma a vida
num trago sem fim. Suas roupas fedem. Não se sabe se ele simplesmente não lava
ou impregnou mesmo. Vai ver anda meio doente mesmo.
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